Festas de fim de ano levam a reencontros com a família, que levam a boas conversas, que levam a lembranças da infância. Quero ser criança pra sempre. Enquanto as outras crianças sonhavam com a importância, a autonomia e a liberdade dos adultos, eu resistia em deixar a infância. Enquanto as outras crianças desejavam acelerar o tempo, eu queria que ele parasse. Nem mesmo a sedutora possibilidade de escolher o que vestir ou o que comer me persuadia a querer crescer. Nem mesmo a liberdade para matar o banho ou comer o que desse na telha me fazia mudar de ideia. O mundo dos adultos parecia muito chato: trabalho sério, obrigações e problemas sufocavam o lúdico, apagavam a fantasia. Meu cobertor marrom, cuidadosamente ajeitado para simular o formato de uma colina, era esconderijo de muitos índios que ficavam de tocaia esperando os soldadinhos desavisados que voltavam ao Forte Apache. Em dias de chuva, o chão do quarto se transformava numa caótica cidade dominada por carrinhos de ferro customizados. Havia imaginação, havia sonho.
Embora eu tenha resistido um pouco, a vida adulta chegou, e com ela, responsabilidades e problemas. As perdas, que eu já havia conhecido de forma precoce na infância, reapareceram, e a necessidade de conquistar um lugar no mundo passou a ser prioridade. Em contrapartida, um mundo menos adocicado, mais interessante e desafiador me conquistou. No lugar das brincadeiras, música. Acho que aceitei passar para a próxima fase no jogo da vida, quando aos 11 anos, ouvi Dreamer – do Supertramp – pela primeira vez. Se adultos podem fazer isso, posso seguir em frente.
Ser criança pra sempre. No fundo, eu sabia que seria impossível vencer o tempo, havia naquela manifestação uma crítica ao mundo dos grandões, onde remédios, traumas e trapaças ganhavam mais atenção do que arte e diversão. Embora amadurecer tenha sido muito bom, manter aquela criança interior que não queria crescer foi um ótimo negócio. Eu tinha certa razão; o mundo é muito chato às vezes, mas fica melhor quando as crianças brincam e os adultos fazem arte.
Lembranças lindas da tua infância. Também brincávamos de Fort Apache, meu irmão e eu. Obrigada por compartilhar tuas escritas conosco. Muito bom ler!
Obrigado pelas palavras, Janete. Que bom você curtiu!
Forte Apache, Falcon, jogo de botão, horas de diversão e entretenimento. Saudades da minha infância .
Esqueci dos jogos de botão… muito bons…
e o jogos de futebol com direito a joelho ralado, ki-suco e pizzaria para contar a quantidade com palitinhos
Boas lembranças, Machado, com exceção do Ki-suco!! Grande abraço.